Iniciada esta quinta-feira, dia 10, o arranque da 72ª edição da Berlinale, o grande elefante na sala, para espectadores e participantes, são as novas condições de funcionamento a que o evento se viu obrigado a adaptar.
Atualmente, a Alemanha está a ultrapassar o seu pico de infeções de COVID-19, ao navegar as ondas de transmissibilidade da variante Ómicron. Contudo, os diretores do festival, Carlo Chatrian e Mariette Rissenbeek, tomaram a decisão ousada de preservar a sua componente presencial. É um contraste direto com a escolha de outros festivais que ocorrem similarmente por esta altura, como é o caso do Sundance Film Festival e do IFFR – International Film Festival Rotterdam, que decidiram manter as suas edições de 2022 em formato online.
Sobre esta diferença, Mariette Rissenbeek justifica a sua posição em entrevista à Screen Daily, à luz do tipo de filmes destacados no Berlinale. Neste sentido, afirma que “é necessária esta apresentação em pessoa, porque o nível de publicidade e atenção que se recebe é diferente. Todos os filmes independentes que mostramos precisam deste momento em que todos – a audiência e a imprensa – está a olhar para eles”.
De modo a poder manter a sua promessa presencial, a direção decidiu tomar medidas que assegurassem ao máximo a higiene e segurança de todos envolvidos. Assim, o festival acabou por sofrer transformações inevitáveis, que desviam esta de outras edições anteriores. Por isso, foi encurtada dos seus habituais 11 dias, para apenas 6, ainda que isto não tenha influenciado o número de filmes em competição, e foi sacrificada a migração do European Film Market, do Berlinale Co-Production Market, do Berlinale Talents e do World Cinema Fund para regimes online.
As salas apresentam também uma capacidade reduzida a 50%, exigindo a todos os participantes a vacinação completa, ou certificado de recuperação, além de um teste antigénio negativo, realizado diariamente. Para este efeito, há centros de testagem posicionados à volta do Berlinale Palast, que até agora parecem estar a funcionar agilmente, apesar dos intrínsecos constrangimentos temporais que implicam. Segundo a Hollywood Reporter, houve algumas queixas de jornalistas e críticos sobre a compulsão do uso de máscaras do tipo específico FFP2, mas o que se sente é maioritariamente um ambiente de aceitação e ajuste.
© Daniel Seiffert / Berlinale
No seu primeiro dia, testemunhou-se a abertura oficial das secções da Competição e do Panorama, múltiplas sessões e conferências de imprensa, bem como o evento da passadeira vermelha. Ainda que abdique das suas habituais festas, este exercício de resistência do 72º Berlinale surge na crença de que não é sobre “impor um modus operandi (em pessoa) em oposição a outro (online), mas antes sobre agir como o guardião de um espaço que corre o risco de desaparecer”, explicou Carlo Chatrian. Acentuou, ainda, a importância do fortalecimento da função social que o cinema tem e a necessidade de o partilhar diretamente com uma audiência, numa comunidade.
Atualmente, perante todos os sacrifícios tomados e o reforço das preocupações sanitárias, os esforços do Berlinale jazem num horizonte de esperança, já que só os próximos dias é que poderão apresentar resultados concretos. Se tudo correr bem, este novo conceito poderá significar, talvez, uma alternativa permanente à contínua ameaça da digitalização dos festivais de cinema.
Margarida Nabais