Nana é o mais recente trabalho da cineasta indonésia Kamila Andini. A narrativa acompanha a vida e os pesadelos de Nana, uma dona de casa, mãe de três filhos que usufrui a vida na alta sociedade enquanto o governo sofre um golpe militar.
Todas as narrativas são compostas por um texto e por um subtexto. O segundo, muitas das vezes, é mais importante que o primeiro. No subtexto podemos encontrar subtramas, posições políticas do autor e reflexões filosóficas sobre a vida. Enquanto acompanhamos a história, jamais o roteiro deixa claro o passado da protagonista. Isto faz com que, por mais que estejamos intrigados, jamais acedamos ao significado de muitos dos problemas que ela enfrenta, o que acaba por tornar o filme confuso.
Apesar dessa falha, o longa é extremamente eficiente em todos os outros aspectos, principalmente na demonstração das emoções de Nana, em longos planos nos quais fuma, alheia aos eventos pelos quais passa. Entediada com suas funções de mulher, Nana costuma ausentar-se do ambiente em que está para observá-lo de longe.
Ela começa uma amizade com a Senhorita Ino, uma mulher mais jovem, de quem se ouve falar que “tem cara de comunista”. Pouco a pouco, Ino passa a alegrar a vida de Nana, e nasce então uma cumplicidade entre as duas que faz com que parte do passado da protagonista seja revelado.
Na segunda metade do filme, um evento inesperado faz com que todos os elementos da equação de sua família tenham que ser reordenados. E não é nada fácil para Nana essa mudança.
Com diversas cores e músicas típicas, o longa é uma jóia para os olhos e ouvidos que aceitam a aventura de descobrir outras culturas. E nesse sentido, as sequências oníricas funcionam com a estética geral, apesar da falha já apontada. É mesmo uma pena que tanto potencial seja desperdiçado por problemas do roteiro, que se preocupa tanto em ser misterioso que acaba em alguns aspectos por fechar-se em si mesmo . A iluminação, a direção de arte e a mise-en-scène são deslumbrantes e tiram o fôlego de quem as vê.
(O uso do espaço negativo é uma das marcas da fotografia – Happy Salma, Ibnu Jamil, Nana de Kamila Andini © Batara Goempar)
Explorando o machismo e suas perversidades – em uma cena particular, Nana diz à filha: “as mulheres precisam guardar muitos segredos” – o melodrama revela uma história sobre os sofrimentos de quem assume a responsabilidade de viver uma vida autêntica. Fotografado magistralmente, os enquadramentos costumam aproveitar o espaço negativo para equilibrar as composições. Mesmo não sendo um filme apaixonante, não deixa de ser um filme muito bom.
Chico Barbosa
[Foto em destaque: Happy Salma, Laura Basuki, Nana de Kamila Andini © Batara Goempar]