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PLAY/REPEAT: exploração cinemática da intimidade dos corpos

1+1. Dois corpos. Movem-se ininterruptamente e não parece haver forma de os parar. Em Play/Repeat, curta-metragem de Carlos E. Lesmes, somos cúmplices da intimidade de um casal. Numa atmosfera de profunda vulnerabilidade, assistimos à materialização da sua relação através da sua expressão corporal. As palavras dão lugar ao movimento e ao gesto e a distância entre os corpos adquire uma dimensão corpórea. Ora se quebra uma ligação, ora se fundem num só que é dois. 1+1=1.  

Exibida na competição oficial EXPERIMENTALEAST do BEAST International Film Festival 2023, Play/Repeat é um exercício experimental, uma revelação do cinema enquanto registo dos corpos que se relacionam no espaço. Nada menos. Nada mais. Temos uma câmara enquanto mecanismo de fixação do toque e da emotividade. Dois corpos confinados às várias divisões de um apartamento. E uma repetição contínua do seu movimento que parece ter como palavras de ordem PLAY e REPEAT.  

PLAY/REPEAT, Carlos E. Lesmes, ©Direitos Reservados

PLAY:  

Enquanto evocação da musicalidade que lhe dá origem. Acompanhada por “Untitled (Play it On Repeat)”, esta curta-metragem resulta da diluição das fronteiras entre disciplinas artísticas. É uma obra híbrida; uma fusão do cinema com o teatro, as artes visuais, a música e a dança. Os corpos que vemos na tela não são atores e meros executores daquilo que foi outrora coreografado. São bailarinos, mas também intérpretes-criadores; participantes no processo de construção cénica. Bebem da arte de produzir significado através da sua catarse corporal. Trazem consigo as suas próprias releituras, num duplo e mútuo estado de afetação que concretiza este filme como uma perpétua viagem de experimentação.  

REPEAT: 

Como se aquilo que vemos na tela não fosse senão o mundano, a observação e constatação daquilo que é inevitável. O quê? A aproximação e o afastamento dos corpos. A natureza paradoxal e a complexidade intrínseca das relações humanas marcadas pelo companheirismo e, simultaneamente, pela solidão. Esta curta-metragem é uma repetição das nossas vidas – da própria humanidade, talvez. É, acima de tudo, uma repetição e uma reinterpretação da vida do realizador. Nasce da sua necessidade de expressar e de sentir corporalmente uma relação passada. Play/Repeat é uma continuidade carnal de si mesmo. Um filme que parte do seu corpo, formando um só que jamais deixará de ser dois: Carlos E Lesmes + Rea Lest.

Maria Mendes

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